terça-feira, 26 de abril de 2011

Vão para puta que pariu!


“Vão pra puta que pariu!” – Este é o recado dados às comunidades indígenas no caso da construção da Usina de Belo Monte.

- Os Conflitos de entre princípios constitucionais na questão indígena.

A Constituição Cidadã Brasileira de 1988, erigiu, em suas longas páginas, uma série de direitos e deveres (art. 5º) e princípios fundamentais do Estado Brasileiro (1º. ao 4º) e da Organização dos Poderes (44 a 135), a representar a pedra fundamental das leis nacionais.
Também estão insculpidos nos arts. 231 e 232, do Titulo VIII (da Ordem Social) princípios protecionistas aos povos indígenas, intencionando manter a ordem social com base no primado do trabalho, e como objetivo o bem estar e a justiça sociais.(art. 193, caput) – Disposição Geral do referido artigo.
Ei-los:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionamente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º. São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias e sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos latos nelas existentes.
§ 3º. O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada a participação nos resultados na lavra, na forma da lei.
§ 4º. As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º. É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipóteses, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º. São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se referem este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando nulidade e a extinção direito à indenização ou a ações contra a União, salvo na foram da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé,
Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.
A luta indígena pela demarcação de suas terras, programas de desenvolvimentos de suas comunidades, muitas vezes já invadidas e dizimasdas física e culturalmente pelos “não-índios”, atendimento médico-sanitário e organização indígena oficial foram ali prometidos.
Recente episódio, porém, criou na sociedade brasileira, perigoso precedente no tratamento dos indígenas, como minorias que são (assim como os negros, as mulheres e os economicamente pobres). O julgamento da Petição n. 3.388/RR, pelo Supremo Tribunal Federal, à ser instado a decidir sobre a demarcação terra indígena da reserva Raposa do Sol, no extremo norte de Roraima, começou com um estudo e um conteúdo histórico louvável para os bancos escolares secundaristas.
Entretanto, a despeito da beleza do voto do Ministro Relator, várias ressalvas foram apostas na parte dispositiva do voto, às quais todos os 11 (onze) ministros da Suprema Corte anuíram, e que, no mínimo, defrontam-se, chocam-se com outros princípios constitucionais, ao rasgarem a parte dos direitos ali garantidos em face, puramente, do interesse econômico estatal; por exemplo, relevando o direito de demarcação que acabara de ser consagrado à população de Roraima retirando destes e dos demais índios o direito do art. 231 , parágrafo 6º, da posse do solo, rios e lagos existentes na comunidade indígena, da exploração de lavras e jazidas localizadas nas terras demarcadas, instituindo, em forma de legislação, o controle dos atos locais pela União e o Conselho de Defesa Nacional, a possibilidade de invasão das terras indígenas de acordo com os interesses econômicos da nação, sem qualquer necessidade de autorização, nem mesmo do Congresso Nacional, como dizia a Carta Magna esbulhada.
A despeito da discussão acerca da contrariedade da decisão, pergunta-se: e o conflito de preceitos constitucionais? Como ficam os direitos garantidos aos índios no art. 223 da CF/88 frente ao princípio da dignidade humana, da erradicação da pobreza (situação em que se encontram boa parte das comunidades indígenas) e desigualdades sociais, da igualdade jurídica do art. 5º (tratar aqueles em situação desigual observando as possibilidades de acordo com as ditas desigualdades), ao dano à imagem e a propriedade imaterial das comunidades indígenas, o direito à informação de seu interesse coletivo, à preservação da cultura e do meio ambiente, à criança, ao adolescente ou ao idoso indígena, transformando a construção da Usina de Belo Monte, que afeta o rio Xingu e as comunidades indígenas dele dependente, numa intervenção federal, previae unilateralmente planejada – talvez com fulcro no pretensioso precedente judicial do STF, com acima referido.
Sim, porque hoje o índio não é mais somente um personagem da história ou um herói ou ídolo, como é contado nas escolas; hoje grande parte das comunidades, inclusive, a despeito dos interesses econômicos ou estrangeiros, querem que sua cultura, sua terra possa ser preservada permanentemente e que possam evoluir, ter acesso à auto sustentabilidad, podendo caminhar com seus próprios passos, sem a necessidade de serem tutelados, ou sem o perigo de serem esbulhados.
Em suma, índio quer ser índio, mas com direitos iguais ao restante da população brasileira!
Como resolver? Como se resolve os conflitos de normas constitucionais? Como diz o jurista Luís Roberto Barroso, em sua obra A Reconstrução Democrática do Direito Público no Brasil. Rio de Janeiro, Ed. Renovar, 2007, p. 261:
“Entendeu o STJ que as regras constitucionais dos incisos XII e LVI não seriam absolutas, exigindo temperamentos, devendo-se ponderá-las com “valores maiores na construção da sociedade”, também expressos na Constituição.”
Nada mais diz esse trecho que, no caso de choque entre princípios constitucionais, a ponderação de valores, tese desenvolvida por Daniel Sarmento (Sarmento, Daniel. A Ponderação de Interesses na Constituição Federal. 1ª. ed., São Paulo:Lumen Juris, 2004), que, em sua obra, na página n. 57, bem observa:
“O método da ponderação de interesses não representa uma técnica puramente procedimental para solução dos conflitos entre princípios constitucionais. Pelo contrário, a ponderação incorpora uma irredutível dimensão substantiva, na medida em que seus resultados devem se orientar para a promoção dos valores humanísticos superiores, subjacentes à ordem constitucional.”
Nesse contexto, será que o a justiça social, a proteção às minorias, à cultura, ao meio ambiente, dentre outros, já não seria suficiente à estagnação dessa “aberração” de Belo Monte, tocada a fundo de caixa em nome do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento “econômico”?

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